A MORTE DOS GRAVATÁS

Por: Branca Amande Cavalcante

Construímos há mais de quarenta anos uma casa, em que todos os compartimentos foram cuidadosamente planejados e desenhados. Aquela casa que você idealizou, sonhou e concretizou. Enfim, seguimos mais ou menos o adágio (se não me falha a memória, de origem chinesa) que diz: “Você se realiza na vida quando constrói uma casa, planta uma árvore e tem um filho”. Concordo somente em parte, porque exatamente acredito que tudo o que construímos ou planejamos e até damos vida, é apenas um processo de renovação e continuação…

A casa continua bonita em toda sua majestosa arquitetura. A piscina, em forma de pé, está com boa aparência. Agora, as plantas¸ as áreas verdes¸ estas sim, sofreram a depredação de pessoas covardes e miseráveis. Os 22 coqueiros estão mortos; algumas árvores frutíferas queimadas e destroçadas (eram 42) e a vegetação decorativa devastada e roubada.

Adoro o verde de todas as espécies (herança de meus pais, ou sou um espírito das matas?), e, sinceramente, de tudo o que já vi, ainda não encontrei uma vegetação tão bela e tão exótica quanto a vegetação amazônica.

Sou uma enamorada dos gravatás, das bromélias, das palmeiras, das orquídeas, azaléias e samambaias. Era uma lavagem para a alma adentrar a mata em busca de gravatás e de outras espécies que enchiam o meu coração de alegria e amor. Com as andanças na mata decorei as áreas do terreno de minha casa com a vegetação nativa que deixava as pessoas felizes e se sentirem bem no meio das plantas. Era um refrigério para a mente e para o corpo. A casa, adaptada à vegetação nativa¸ dava uma sensação diferente àqueles que nos visitavam, acrescendo-se a tudo isso os pássaros que praticamente confraternizavam conosco, fazendo ninhos em galhos baixos, pois sabiam que o seu território era sagrado. Alimentava-os e lhes dava de beber, a par do banho na piscina que eles realizavam quando a mesma estava com pouqíssimo cloro (sabedoria da natureza). O cântico dos sabiás, das graúnas, dos rouxinós do Rio Negro, dos sanhaçus, peitos roxos, rolinhas, os audaciosos bem-te-vis, japiins, faziam daquele paraíso a terapia que todos nós necessitávamos. As pessoas diziam com sinceridade: “saio da sua casa leve e feliz”. Isto era maravilhoso! Além do orgulho que as plantas me davam eu me sentia recompensada em proporcionar aos outros momentos de felicidade. Os gravatás, especialmente, eram a minha paixão!

Agora, encontro tudo destruído e a erva daninha destruindo o que sobrou¸ inclusive as acácias douradas e os ipês. Triste desolação! Chorei, chorei muito e como o autor de “Por quem os sinos dobram” chorei pelas plantas, por mim, por você e por toda a humanidade que se autodestrói, quando destrói a vegetação; que pratica gradativamente o suicídio quando maltrata e arrebenta  com o ecossistema; que não entende que o ser humano só se perpetuará se conservar a natureza, porque ele (homo sapiens?) só viverá se preservar o que existe de mais perfeito no mundo e que Deus nos doou – a Mãe Natureza. E os gravatás? Todos mortos? Em meio a erva daninha que não poupou nem a grama, encontrei, no emaranhado de carrapichos, pequenino, todo inclinado como se estivesse pedindo socorro quando me viu, um gravatá, um dos mais raros; com cuidado, como se trata de um bebê que está quase morrendo, retirei-o, com carinho, e o coloquei em outro local. Comecei a cuidar dele.

Em 20 dias, o gravatá sobreviveu, fortificou-se e, como num verdadeiro milagre de amor e gratidão, desabrochou em uma pequena flor. Realizava-se o milagre da vida! Sobrevivente de uma guerra maldita, ali estava o herói dos gravatás!